O que vai acontecer na próxima cena? Esperar curioso pelo desfecho das imagens seguintes é algo que esperamos de todos os filmes.
Infelizmente, nem todos são assim. Aliás, a maioria é completamente previsível. Por outro lado, ainda existem pérolas do cinema mundial, como é o caso de O Segredo de Seus Olhos. Protagonizado por Darín, um ator cheio de mistério no olhar, o roteiro foi escrito por Juan José Campanella e Eduardo Sacheri, a partir de um livro com o mesmo nome.
A história é sobre Benjamín Esposito, um oficial de justiça aposentado que decide escrever um romance baseado em um caso ocorrido há 30 anos. Na época, ele atuava como assistente da promotora Irene (Villamil) e se envolveu na investigação de um estupro seguido de assassinato. A vítima foi a bela esposa do bancário Rago, cuja história comoveu a todos.
Pascal dizia que "Os olhos são os intérpretes do coração, mas só os interessados entendem essa linguagem."
Com certeza, Benjamin era um interessado, pois encontrou o culpado através de algumas fotografias que a bela guardava e outros indícios quase impossíveis de serem percebidos. Porém, foi com frustração que acompanhou a absolvição do criminoso. Trinta anos depois, com muitas reviravoltas, ele decide saber como os personagens estão.
Assim, enquanto mergulha em suas memórias e reata relacionamentos com antigos colegas, se descobre ainda encantado por Irene, embora esta agora esteja casada e com filhos.
Ao longo das cenas, também acompanhamos a conturbada história política da Argentina, principalmente na década de 70. Nesse contexto, Campanella constrói uma narrativa que traz, como tema central, a maneira com que somos eternamente aprisionados por nossas memórias mais marcantes: sendo sempre aconselhado a parar de pensar no passado, Benjamín não consegue se libertar do peso das lembranças que, de forma ainda mais cruel, se revelam incertas e inconstantes como as recordações mais importantes costumam ser.
Os instantes mais dramáticos iluminam nossas próprias vidas são intercalados com outros de um humor extremamente eficaz. Aliás, é esta sensibilidade para retratar a experiência humana que transformam o argentino num cineasta tão envolvente: em certo instante, por exemplo, o personagem vivido de forma divertida pelo comediante Guillermo Francella faz um belo discurso sobre como não podemos jamais nos libertar de nossas paixões e como isso pode ser encarado como um ponto fraco do homem que perseguem – e a propriedade do que é dito é tamanha que simplesmente não podemos ignorar o que aquelas palavras revelam sobre nós mesmos.
Além disso, os cenários parecem realmente ter sido ocupados há anos por aquelas pessoas, trazendo elementos das personalidades dos personagens em seus detalhes e uma impressão de desgaste natural, desde o escritório empoeirado e amontoado de papéis dividido por Benjamín e Pablo até o detalhe da máquina de escrever estragada (e que servirá para uma bela rima narrativa ao final da projeção).
Absolutamente fascinante do início ao fim, é assim que poderíamos definir esta produção, que começa em um helicóptero que sobrevoa um estádio de futebol e termina em seu gramado.
O desfecho não só rico de significados, mas surpreendente.
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